Por Letícia Sepúlveda, aluna de jornalismo da PUC-SP
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Após 12 anos de intervenção militar no Haiti, o país ainda enfrenta instabilidade, miséria e sofre com as consequências de mais um desastre climático. Além das inúmeras denúncias de violações de direitos humanos e dos milhares de imigrantes espalhados pelo mundo. No ano de 2004, quando o então presidente, Jean-Bertand Aristide, foi deposto, as Nações Unidas implantaram uma missão de paz no país, que tinha como objetivo restabelecer a segurança, a estabilidade e a economia. O exército brasileiro foi escolhido para comandá-la. A Missão foi intitulada de Minustah (Missão das Nações Unidas para Estabilização do Haiti).

A intervenção estava prevista para terminar este ano, entretanto com a chegada do furacão Matthew no dia 4 de outubro, deixando cerca de 1000 mortos e milhares de feridos e desabrigados, as perspectivas mudaram. Durante estes 12 anos, inúmeros casos de violação dos direitos humanos, tendo como culpados militares das tropas da Minustah foram relatados. O Brasil tem grande responsabilidade em relação a isto, uma vez que assumiu o comando da Missão. Episódios de abusos sexuais, introdução do cólera, repressão à liberdade de expressão e direitos negados em relação a greves trabalhistas foram denunciados. Existe também a relação entre as ações das Forças Armadas no Haiti e a atuação das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) nas comunidades pobres do Rio de Janeiro.

Em meio a miséria e a falta de perspectivas, uma grande massa de haitianos imigraram para o Brasil. De acordo com a Polícia Federal, em 2015, foram 14.535. Em nível jurídico eles não são considerados como refugiados. Desastres climáticos e pobreza se enquadram na categoria de imigração.

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Miguel Borba de Sá

Por conta da crise econômica e da falta de empregos, além da dificuldade de se inserir socialmente, muitos estão trocando o Brasil pelo Chile. Segundo a Polícia Federal, de janeiro ao final de abril de 2016, 3.234 haitianos saíram do território nacional. Atualmente o governo chileno estima que há cerca de 9 mil no país. Atualmente a Missão enfrenta muitas incertezas e desafios. Sobre esta realidade, o especialista em Relações Internacionais, Miguel Borba de Sá, doutorando na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e membro da rede Jubileu Sul Brasil, explica suas opiniões sobre o assunto:

Letícia Sepúlveda: Qual a sua opinião sobre a Missão Minustah? Como avalia as ações do exército brasileiro?

Miguel Borba de Sá: Os dois objetivos principais da MINUSTAH eram (i) a “estabilização” política do Haiti e (ii) o fortalecimento da democracia no país caribenho para que a economia pudesse se desenvolver. Passados 12 anos de intervenção militar estrangeira, nenhum desses objetivos foi alcançado. Hoje o Haiti é um lugar mais instável, mais pobre e menos democrático do que era antes de fevereiro de 2004, quando um golpe de Estado foi perpetrado por setores da elite haitiana em colaboração com poderosos interesses econômicos e geopolíticos na França e nos Estados Unidos da América. A missão das Nações Unidas começa, portanto, a partir de uma quebra da legalidade constitucional, e busca sustentar até hoje um regime de participação restrito, no qual a população haitiana não tem o direito de escolher livremente seus representantes caso opte por candidatos e agendas políticas que desagradem à comunidade internacional.

As ações do Exército brasileiro possuem várias dimensões, mas, de modo geral, pode-se afirmar que as têm servido sobretudo para manter um status quo político artificial e que não se sustentaria caso as tropas deixassem que as haitianas e haitianos decidissem soberanamente os rumos de sua economia e sociedade. Assim como nas ocupações de favelas no Rio de Janeiro durante os megaeventos esportivos recentes, a atuação do Exército tem um caráter primordialmente repressivo sobre populações pobres e negras, então não é possível fazer um balanço positivo destes últimos 12 anos.

LS: O que tem a dizer sobre os casos de violação dos direitos humanos em missões de paz da ONU, os quais foram muito recorrentes nas missões do Haiti e da Libéria?

MBS: Infelizmente, os casos de violações de direitos humanos em operações de paz das Nações Unidas são uma regra, e não uma exceção. Não apenas no Haiti e na Libéria, mas também no Congo, Serra Leoa, enfim, em praticamente todos os locais em que intervenções militares estrangeiras de caráter multilateral foram realizadas existe um histórico de denúncia de abusos sexuais, exploração da vulnerabilidade dos habitantes locais, perseguição e repressão às manifestações políticas e organizações sindicais, dentre outros. É importante afirmar que as violações não são fruto de atitudes individuais e isoladas deste ou daquele soldado, mas que são uma prática sistemática das intervenções ditas “humanitárias” e fazem parte da essência deste tipo de concepção de “ajuda” calcada num aumento da militarização das sociedades.

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foto: Agência Brasil

Vale lembrar que no Haiti, o direito à saúde e à informação também foram sistematicamente violados pelas Nações Unidas (ONU), cujas tropas trouxeram o vírus do cólera e o disseminaram na população, contaminando mais de 600 mil pessoas e tirando a vida de cerca de 8 mil. Isto é lamentável, um verdadeiro absurdo. E pior: durante anos a ONU negou-se a assumir sua responsabilidade por estas vítimas. Então trata-se de uma política irresponsável e danosa, que termina aprofundando o quadro de negação de direitos a que estas sociedades já estavam submetidas.

LS: Analisando as normas do Direito Internacional Humanitário, em sua opinião, por que estes casos acontecem?

MBS: Estes casos acontecem por causa da lógica que está por trás das chamadas “intervenções humanitárias”. Elas não são destinadas a ajudar verdadeiramente os países e povos que ocupam militarmente. Seu objetivo, na maioria das vezes, é garantir que determinados arranjos econômicos e geopolíticos sejam mantidos ou criados, em especial a consolidação de regimes locais que garantam acesso a recursos naturais e mão-de-obra a preços baixos, que são exploradas por grandes corporações transnacionais. No caso do Haiti, os setores de turismo de luxo, mineração, agronegócio e maquiladoras da indústria têxtil são os que interessam ao grande capital internacional. Diversas empresas norte-americanas, francesas – e agora, também, brasileiras – se beneficiam dos baixos salários pagos à população haitiana, assim como de uma legislação trabalhista e ambiental frágil. Marcas famosas como Levis e Disney (e Coteminas) produzem suas malhas no Haiti e precisam de governos comprometidos com seus interesses de investidores. Não podem aceitar por muito tempo governantes que desagradem seus objetivos, que diminuam suas margens de lucro, como fez o ex-presidente, Jean-Bertrand Aristide, deposto duas vezes, em 1991 e 2004, justamente por tentar implementar políticas sociais mais amplas, que regulavam os mercados. Então, diante de objetivos assim, a violação de direitos humanos continuará sempre sendo a regra, jamais a exceção ou “casos isolados” como tenta-se retratar a cada vez que vaza uma denúncia.

LS: Após o furacão Matthew, o que você espera da Missão Minustah? Você é a favor que o Brasil continue mandando mais tropas? Justifique.

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Foto: Agência Brasil

MBS: Após o furacão Matthew o Brasil tem uma nova oportunidade de mudar sua política ingerencista no Haiti. É hora de substituir a invasão militar por um tipo de solidariedade verdadeira: com alimentos, mantimentos, professores, médicos, assistentes sociais e outros profissionais que realmente vão lá para ajudar a população civil, em vez de reprimi-la. A MINUSTAH é formada, na sua maioria, por contingentes militares oriundos de países latino-americanos. Mas é sempre bom lembrar que países como Venezuela e Cuba nunca mandaram um soldado sequer para o Haiti e sempre contribuíram bastante com recursos humanos e materiais durante e após as catástrofes naturais que a ilha sofreu. Essa ajuda não militarizada aconteceu após o terremoto de 2010 e, agora, com os danos causados pelo furacão também, chegando, inclusive, mais rápido que a de outros países mais ricos e com maior capacidade infraestrutural. Então o Brasil poderia adotar este outro modelo de ajuda, que é mais eficaz e sem chance de causar danos colaterais a um território já castigado.

LS: Como você avalia as semelhanças entre as ações das UPPs (Unidade de Polícia Pacificadora) nas comunidades do Rio de Janeiro e as ações das tropas do exército brasileiro na missão Minustah?

MBS: As semelhanças entre as UPPs e a MINUSTAH são enunciadas, antes de tudo, pelos próprios comandantes militares destas forças de ocupação. São eles que não perdem uma oportunidade para, orgulhosamente, traçar paralelos entre as “pacificações” de lá e daqui. E esta associação se dá para além do discurso, traduzindo-se em diversos intercâmbios de experiências entre as duas realidades, promovidos pelas forças ocupantes.

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Foto: Mídia Informal

No entanto, tanto no Haiti como no Rio de Janeiro, os resultados são decepcionantes. Em ambos os casos o que se vê é uma postura agressiva por parte das forças armadas para com a população civil, geralmente pobre e negra, tratada sempre como criminosos em potencial, que precisariam de forte repressão estatal para civilizar-se. É uma postura racista e elitista, que possui antecedentes muito antigos na História da sociedade e do Estado no Brasil, que foi o último país do continente a abolir oficialmente a escravidão em 1888 (enquanto o Haiti o fez pioneiramente durante sua revolução de independência entre 1791 e 1804). Vale lembrar que desde o século XIX a elite brasileira já apresentava uma tendência a tratar as populações pobres e negras como “classes perigosas” e naquele século cunhou-se a expressão “Haitianismo” para designar o medo e justificar as políticas violentas que as classes proprietárias empregavam para evitar que uma repetição da revolução haitiana acontecesse no Brasil. Então é essa lógica herdeira do escravismo que ainda persiste hoje em dia na forma de UPPs, BOPE, Caveirão, MINUSTAH…

É uma lástima, uma vergonha para nós brasileiros e brasileiras. Mas é a realidade e não pode ser escamoteada: o racismo da elite e a truculência seletiva do Estado são as principais características que unem as estratégias de controle social chamadas eufemisticamente de “pacificação” no Rio de Janeiro e no Haiti.

E quem muitas vezes lucra com essas operações são as organizações não-governamentais (ONGs) que canalizam, sem transparência alguma, os recursos que supostamente seriam destinados a fazer avançar a parte “social” de tais processos. O caso do Viva Rio é emblemático desta indústria humanitária: é uma ONG que trabalha para legitimar intervenções militares, lucrando com a retenção dos recursos recebidos de governos e pessoas bem-intencionadas. Além de sua sede no Rio de Janeiro, eles também possuem uma em Porto-Príncipe (capital do Haiti), com mais de 110 funcionários. Sua receita anual atinge R$ 16,5 milhões e contam com 6 mil funcionários atuando em 50 municípios do Rio de Janeiro, em outros estados brasileiros e em países como Colômbia, Panamá e Congo. Além de recursos públicos eles estabelecem parcerias com grandes corporações como a Coca-Cola e também no mercado financeiro, como no fundo que é gerido pela Oceania Investimentos. Trata-se de um serviço desumano e cruel, que lucra com a desgraça alheia, doméstica e internacionalmente – mas que vende-se como benfeitor e altruísta.

LS: Segundo o Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) os gastos brasileiros com a missão de paz no Haiti chegaram a cerca de 2,12 bilhoes de reais até 2014. Qual a sua opinião em relação a estes gastos? Acha que eles deveriam continuar?

MBS: Assim como os gastos com a rolagem e financiamento da dívida pública, os gastos militares geralmente não recebem a atenção que mereceriam pela imprensa na hora de anunciar as políticas orçamentárias e fiscal no Brasil. No entanto, ambos são gastos que oneram muito os cofres públicos e que poderiam ser melhor empregados em outras iniciativas, pacíficas, de verdadeira solidariedade entre os povos. Em tempos de crise econômica e ajuste fiscal, deveriam ser os primeiros gastos a ser cortados, mas o que se vê é uma política oposta: mais militarização e mais endividamento. O governo não eleito de Michel Temer aprofunda esta tendência, que já existia na gestão anterior. Então, tais gastos deveriam passar por auditorias integrais, com participação da sociedade civil, para que se soubesse exatamente o quanto é gasto e, assim, tornar possível uma inversão de prioridades.

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Foto: Haiti No Minustah

Agora, uma coisa é fundamental: após mais de uma década investindo na militarização e repressão dos anseios de participação política democrática da população haitiana, o Brasil não pode simplesmente lavar as mãos e sair do Haiti como se não tivesse responsabilidade pela dramática situação social que ajudou a produzir e sustentar no país caribenho com intervenção militar que comandou desde 2004 até 2016. Se gastamos tanto dinheiro levando armas e soldados para lá durante tanto tempo, seria no mínimo razoável que gastássemos o mesmo montante com iniciativas realmente solidárias, pacíficas e civis, destinadas ao povo que tanta inspiração proporciona aos amantes da liberdade e da igualdade na América Latina e Caribe e em todo o mundo.

Fuente: Jubileu Sul Brasil


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Entrevista: Las promesas incumplidas de la misión de paz en Haití

Por Leticia Sepúlveda, estudiante de periodismo en la PUC-SP

Tras 12 años de intervención militar en Haití, el país todavía se enfrenta a inestabilidad, pobreza y sufre por las consecuencias de otro desastre climático, además de las numerosas denuncias de violaciones de derechos humanos y de los miles de inmigrantes esparcidos en todo el mundo. En 2004, cuando el entonces presidente Jean-Bertrand Aristide fue derrocado, las Naciones Unidas enviaron una misión de paz en el país, que tenía por objetivo restablecer la seguridad, la estabilidad y la economía. El ejército brasileño fue elegido para comandarla, la misión fue denominada de MINUSTAH (Misión de Estabilización de las Naciones Unidas en Haití).

Se esperaba que la intervención terminara este año, pero con la llegada del huracán Matthew el 4 de octubre, dejando alrededor de 1.000 muertos y miles de heridos y personas sin hogar, el panorama cambió. Durante estos 12 años se han constatado numerosos casos de violaciones de derechos humanos, teniendo como culpables los militares de las tropas de la MINUSTAH. Brasil tiene una gran responsabilidad en este sentido, ya que tomó el mando de la misión; Se reportaron episodios de abuso sexual, introducción del cólera, represión de la libertad de expresión y derechos negados en relación con las huelgas laborales. Hay también una  relación entre las acciones de las Fuerzas Armadas de Haití y de las actividades de la UPP (Unidad de Policía Pacificadora) en las comunidades pobres de Río de Janeiro.

En medio de la pobreza y la falta de perspectivas, una gran masa de haitianos emigró a Brasil. Según la Policía Federal, en 2015 era 14.535 haitianos, en términos legales no son considerados como refugiados. Los desastres climáticos y la pobreza entran en la categoría de inmigración.

Debido a la crisis económica y el desempleo, además de la dificultad de insertarse socialmente, muchos están cambiando Brasil por Chile. Según la Policía Federal, de enero a finales de abril de 2016, 3.234 haitianos abandonaron el país. Actualmente, el Gobierno de Chile estima que hay alrededor de 9.000 en el país. En este momento, la Misión se enfrenta a muchas incertidumbres y desafíos. Acerca de esto hecho, el experto en Relaciones Internacionales, Miguel Borba de Sá, estudiante de doctorado de la Universidad Católica de Río de Janeiro y miembro de la red Jubileo Sur Brasil, explica sus puntos de vista sobre el tema:

Leticia Sepúlveda: ¿Cuál es su opinión sobre la MINUSTAH? ¿Cómo evalúa las acciones del ejército brasileño?

Miguel Borba de Sá: Los dos objetivos principales de la MINUSTAH fueron: (I) la “estabilización” de la política de Haití y (II) el fortalecimiento de la democracia en el país caribeño, para que la economía pudiera desarrollarse. Tras 12 años de intervención militar extranjera, ninguno de estos objetivos se ha logrado. Hoy Haití es un lugar más inestable, más pobre y menos democrático de lo que era antes de febrero de 2004, cuando un golpe fue perpetrado por sectores de la élite de Haití en colaboración con fuertes intereses económicos y geopolíticos de en Francia y los Estados Unidos. La misión de la ONU comienza, por lo tanto, de un incumplimiento de la legalidad constitucional, y  hasta el día de hoy  procura sustentar un esquema de participación restringida, en la que la población de Haití no tiene el derecho a elegir libremente a sus representantes en caso de elegir a los candidatos y las agendas políticas que no agradan a la comunidad internacional.

Las acciones del Ejército de Brasil tienen diversas dimensiones, pero en general se puede decir que han servido principalmente para mantener un status quo político artificial y que no se sostendría en caso de que las tropas dejaran que los haitianos decidieran soberanamente la dirección de su economía y la sociedad. Al igual que las ocupaciones de favelas de Río de Janeiro durante los últimos mega eventos deportivos, la actuación del Ejército tiene un carácter fundamentalmente represivo en las poblaciones pobres y negras. De ese modo, no se puede hacer una valoración positiva de estos últimos 12 años.

LS: ¿Qué tiene que decir acerca de los casos de violación de los derechos humanos en las misiones de paz de la ONU, que eran muy recurrentes en las misiones en Haití y Liberia?

MBS: Por desgracia, los casos de violaciones de derechos humanos en las operaciones de paz de las Naciones Unidas son una regla, no una excepción. No sólo en Haití y Liberia, sino también en el Congo, Sierra Leona, en definitiva, en casi todos los lugares donde se llevan a cabo intervenciones militares extranjeras de carácter multilateral. Hay una historia de denuncia de abuso sexual, explotación de la vulnerabilidad de los habitantes locales, persecución y represión de las manifestaciones políticas y sindicatos, entre otros. Es importante señalar que las violaciones no son el resultado de acciones individuales y aisladas de este o aquel soldado, sino que es una práctica sistemática de las intervenciones “humanitarias”, y son parte de la esencia de este tipo de concepto de “ayuda”  en un aumento de la militarización de sociedades.

Cabe señalar que en Haití, se violaron también sistemáticamente el derecho a la salud y la información por las Naciones Unidas (ONU), cuyas tropas han traído el virus del cólera y lo diseminaron en la población, contaminando más de 600 mil personas y falleciendo alrededor de 8000. Esto es lamentable, realmente absurdo. Peor aún: durante años la ONU ha negado a asumir la responsabilidad de estas víctimas, por lo tanto, es una política irresponsable y dañina, profundizando el marco de negación de los derechos al que estas sociedades ya estaban sometidas.

LS: Analizando las normas del Derecho Internacional Humanitario, en su opinión, ¿por qué estos casos ocurren?

MBS: Estos casos ocurren debido a la lógica detrás de las llamadas “intervenciones humanitarias”. Ellas no tienen el propósito de ayudar verdaderamente a los países y las personas que ocupan militarmente, su objetivo, en la mayoría de los casos, es asegurar que ciertos arreglos económicos y geopolíticos se mantengan o se creen, en particular, la consolidación de esquemas locales para garantizar el acceso a los recursos naturales y la mano de obra a precios bajos, que son explotadas por las grandes corporaciones transnacionales. En el caso de Haití, los sectores turísticos de lujo, la minería, la agroindustria y las maquilladoras de la industria textil son lo que importa para el gran capital internacional. Diversas compañías estadounidenses, francesas – y ahora también brasileñas – se benefician de los bajos salarios pagados a la población de Haití, así también de una legislación laborista y ambiental frágil. Marcas famosas como Levis y Disney (y Coteminas) producen sus prendas de punto en Haití y necesitan gobiernos comprometidos con sus intereses de inversores, no pueden aceptar a largo plazo gobernantes que desagradan a sus objetivos, que reducen sus márgenes de ganancia, como lo hizo el ex presidente Jean-Bertrand Aristide, depuesto dos veces, en 1991 y 2004, justamente por tratar de implementar políticas sociales más amplias que regulaban los mercados. Por lo tanto, frente a estos objetivos, la violación de los derechos humanos seguirá siendo siempre la regla, nunca la excepción o “casos aislados”, como intenta retratarse cada vez que se filtra una denuncia.

LS: Después del huracán Matthew, ¿qué espera de la MINUSTAH? ¿Está a favor de que Brasil mantenga el envío de más tropas? Justifique.

MBS: Después del huracán Matthew, Brasil tiene una nueva oportunidad de cambiar su política intervencionista en Haití. Es el momento de sustituir la invasión militar por un tipo de verdadera solidaridad: con alimentos, materiales de construcción, maestros, médicos, trabajadores sociales y otros profesionales que realmente vallan para ayudar a la población civil en lugar de reprimirla. La MINUSTAH está formada en su mayoría por contingentes militares procedentes de países latinoamericanos, pero siempre es bueno recordar que países como Venezuela y Cuba nunca enviaron un único soldado a Haití y siempre han contribuido mucho con los recursos humanos y materiales durante y después de los desastres naturales que sufrió la isla. Esta ayuda no militarizada ocurrió después del terremoto de 2010 y ahora, con los daños causados por el huracán también, viene incluso más rápido que otros países más ricos y con mayor capacidad de infraestructura. Así que Brasil podría adoptar este otro modelo de ayuda, que es más eficaz y no hay posibilidad de causar daños colaterales a un territorio ya castigado.

LS: ¿Cómo evalúa las similitudes entre las acciones de la UPP (Unidad de Policía Pacificadora) en las comunidades de Río de Janeiro y las acciones de las tropas del ejército brasileño en la MINUSTAH?

MBS: Las similitudes entre la UPP y la MINUSTAH se exponen sobre todo, por sus propios comandantes militares de estas fuerzas de ocupación, son ellos los que no dejan pasar la oportunidad de, con orgullo, trazar paralelismos entre las “pacificaciones” de allí y aquí; Y esta asociación se da además del discurso, en diversos intercambios de experiencias entre las dos realidades, promovidos por las fuerzas de ocupación.

Sin embargo, tanto en Haití como en Río de Janeiro, los resultados son decepcionantes. En cualquiera de los casos, lo que se ve es una postura agresiva de los militares a la población civil, en general, pobre y negra, siempre tratados como criminales potenciales, que necesitarían una fuerte represión estatal para civilizarse. Es una postura racista y elitista, que tiene antecedentes muy antiguos en la historia de la sociedad y del Estado en Brasil, que fue el último país en el continente a abolir oficialmente la esclavitud en 1888 (mientras que Haití fue pionera en su revolución de independencia entre 1791 y 1804). Cabe señalar que desde el siglo XIX la elite brasileña ya tenía una tendencia a tratar a las poblaciones pobres y negras como “clases peligrosas” y en ese siglo acuñó la expresión “Haitianismo” para describir el miedo y justificar las políticas violentas que las clases propietarias utilizaban para evitar que una repetición de la revolución haitiana sucediera en Brasil. Así que es esta lógica heredera de la esclavitud la que todavía existe al día de hoy en forma de UPP, BOPE, Caveirão, la MINUSTAH…

Es una pena, una vergüenza para nosotros brasileños, pero es la realidad y no se puede ocultar: el racismo de la élite y la truculencia selectiva del Estado son las principales características que unen a las estrategias de control social que se llama, de forma eufemística, “pacificación” en Río de Janeiro y en Haití.

Y las que a menudo se benefician de estas operaciones son las organizaciones no gubernamentales (ONG) que encaminan, sin ninguna transparencia, los recursos que supuestamente serían destinados para hacer avanzar la parte “social” de estos procesos. El caso de Viva Rio es emblemático en esta industria humanitaria: es una ONG que trabaja para legitimar intervenciones militares, ganando con la retención de los fondos recibidos de los gobiernos y las personas bien intencionadas. Además de su sede en Río de Janeiro, también tienen una en Puerto Príncipe (capital de Haití), con más de 110 empleados. Sus ingresos anuales llegan a R$ 16,5 millones y tiene 6.000 empleados que operan en 50 municipios de Río de Janeiro, en otros estados y países como Colombia, Panamá y el Congo. Además de los fondos públicos, establecen alianzas con grandes corporaciones como Coca-Cola y también en el mercado financiero, como el fondo que es administrado por la Oceanía Inversiones. Se trata de un servicio deshumano y cruel, que se beneficia de la desgracia de los demás, nacional e internacionalmente -, pero que se vende a sí mismo como un benefactor y altruista.

LS: Según el Sistema Integrado de Administración Financiera del Gobierno Federal (Siafi) los gastos de Brasil en la misión de paz en Haití se elevó a unos 2.12 millones de reales para el año 2014. ¿Cuál es su opinión sobre estos gastos? ¿Usted piensa que deben continuar?

MBS: Al igual que los gastos del desplazamiento y financiación de la deuda pública, los gastos militares en general no reciben la atención que merecen por la prensa a la hora de dar a conocer las políticas presupuestarias y fiscales en Brasil, sin embargo, ambos son gastos que pesan mucho las arcas públicas y que podrían ser mejor ocupados en otras iniciativas, pacíficas, de verdadera solidaridad entre los pueblos. En tiempos de crisis económica y el ajuste fiscal, deberían ser los primeros gastos a ser cortados, pero lo que vemos es la política opuesta: más militarización y más deuda. El gobierno no elegido de Michel Temer profundiza esta tendencia, que ya existía en la anterior administración. Por lo tanto, estos gastos deben ser sometidos a auditorías completas, con la participación de la sociedad civil, para que sepan exactamente cuánto se gasta y, por consiguiente, hacer posible una inversión de prioridades.

Ahora, una cosa es esencial: después de más de una década de inversión en la militarización y represión de los anhelos de participación política democrática de la población de Haití, Brasil no puede simplemente lavarse las manos y dejar Haití como si no tuviera ninguna responsabilidad por la dramática situación social que ayudó a producir y mantener el país caribeño con la intervención militar que comando desde 2004 hacia 2016. Si gastamos tanto dinero llevando armas y soldados allí durante tanto tiempo, sería al menos razonable que gastemos la misma cantidad con iniciativas realmente solidarias, pacíficas y civiles dirigidas al pueblo que tanta inspiración ofrece a los amantes de la libertad y la igualdad en América Latina y el Caribe, así como en todo el mundo.