#MulheresTerritóriosdeLuta: resistência pelo direito à água no Chile

Por Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs)

Em 2019, após anos de sucateamento da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE), um episódio de contaminação da água foi mobilizado como justificativa para mais uma tentativa de privatização do serviço no estado. Aprovado em novembro de 2019 na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 4162/2019 que prevê a privatização dos serviços de saneamento básico em território nacional, através da transferência do serviço para a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), encontra-se em trânsito no Senado. A aprovação do PL estabeleceria um novo marco regulatório que pode aumentar a dificuldade do acesso aos serviços, em um país onde apenas 53,2% da população utiliza esgotamento sanitário e 83,6% tem acesso a serviços de abastecimento de água[1].

Próximo de nós, encontramos a experiência chilena onde a água foi privatizada pela ditadura de Pinochet, em 1980. Para contribuir na reflexão sobre o agravamento nas desigualdades gerado pela privatização desse bem comum e tão fundamental à vida, seus impactos sobre as mulheres e outras reflexões da luta ambiental feminista no Chile, damos sequência a série de entrevistas da Campanha #MulheresTerritóriosdeLuta e trazemos uma conversa com Francisca Fernandez, que atua no Movimento por el Água y los Território e na Coordinadora Feminista 8M, no Chile. Francisca participou do terceiro episódio do Ciclo de Debates, que teve como tema “Cuidado coletivo e ancestralidades nas práticas de (re)existência”. O debate está gravado e você o encontra do canal do Instituto Pacs no YouTube. A entrevista foi realizada por Marina Praça, coordenadora e educadora popular, e Yasmin Bitencourt, pesquisadora e educadora popular, ambas do Instituto Pacs.

Pacs: Francisca, conta para gente um pouco da sua atuação na luta ambiental e pela água no Chile?

Francisca: Sou parte do Movimiento por el Agua y los Territorios (MAT), que criamos em 2013. Uma vez por ano há um encontro organizado por uma ONG, o Observatorio Latinoamericano de Conflictos Ambientales (OLCA), que se chama AguAnte la Vida, no qual distintos territórios vão contando seus conflitos socioambientais, pensando também em como geri-los. Nesse encontro dissemos: necessitamos criar um movimento social cujo um dos eixos principais seja a privatização da água no Chile.

A água no Chile foi privatizada com a Constituição de 1980, do ditador Pinochet. Em 1981, criaram um Código de Água que afirma que embora a água seja um bem de uso público, seu acesso se dá através de “direitos de aproveitamento (ou de uso)”. Portanto, esses direitos são literalmente a privatização, que permite comprar, vender, alugar e até hipotecar direitos. Vocês nem imaginam, mas no Chile, nos jornais, há avisos econômicos nos quais se vendem rios completos. É esse nível de atrocidade.

Pacs: E como foi a criação do MAT?

Francisca: Criamos o MAT em 2013 e o interessante é que nessa caminhada pela luta contra a privatização, nessa marcha pela derrogação do Código de Água, fomos assumindo certas perspectivas.

A primeira é uma perspectiva plurinacional. Entendemos que somos povos distintos, organizados pela luta de recuperação da água. De fato, somos mais de 100 organizações, de Arica a Magallanes, todo o Chile, e dizemos que somos plurinacionais porque somos um conjunto de povos, comunidades e territórios – povos originários, afro, imigrantes. Entendemos o rural e o urbano também como distintas comunidades políticas.

Mas, há uns 4 anos, também nos definimos um movimento antipatriarcal – o que entendo como um marco muito importante -, pois consideramos que o extrativismo, a extração ilimitada de nossos bens comuns, como a água, a terra, tinham também um forte caráter patriarcal, já que a forma de explorar a natureza tem sido a mesma que explora o corpo de mulheres e meninas. Além disso, o extrativismo se intensifica sobre as mulheres por conta de precariedades laborais, do não reconhecimento do trabalho reprodutivo do cuidado da vida; mas também somos nós, as mulheres, as mais localizadas nos territórios de resistências. Então, a partir disso é que, há dois anos, as mulheres do MAT, com mulheres de outras organizações, construíram o Comitê Socioambiental da Coordinadora Feminista 8M.

Em outras palavras, a partir de nossa luta territorial socioambiental, nos conformamos enquanto comitê feminista e parte da Coordinadora. Acho muito interessante, porque é outra forma de entender a trajetória feminista. Não uma trajetória feminista focada somente na reflexão feminista, mas uma trajetória que vem da reflexão territorial e que, a partir daí, nos reconhecemos feministas. Tenho companheiras, por exemplo no comitê socioambiental, duas com mais de 70 anos e que se reconhecem feministas há 2 anos a partir da luta ambiental. Então, para nós, foi super poderoso entender essa jornada, que tem sido uma jornada diferente.

Pacs: Vocês fazem uma crítica direta aos megaprojetos e à alguma empresa com nome importante?

Francisca: Sim. O que ocorre é que o Chile é muito extenso (não grande, risos), então podemos dizer que focamos nos conflitos socioambientais segundo cada territorialidade. No norte do país, que é desértico, fronteiriço com Peru e Bolívia, a grande luta é contra a megamineração. Isso não anula que em todo o território chileno haja mineração, mas é no Norte em que há mais conflitos, porque, por um lado, estão as transnacionais explorando o território, mas ao mesmo tempo há uma empresa estatal, Codelco. Então aqui há uma mistura de lutas contra mineradoras como Cerro Colorado, Collahuasi, mineradoras de Codelco, em geral implantadas no território.

Em contrapartida, na zona Centro-Sul também há mineração. Por exemplo, aqui, a mineração complexa é Anglo American, que destrói o território. Mas uma das questões importantes que temos é o agronegócio, a agroindústria, que trouxe problemas com pesticidas, inseticidas e as sementes transgênicas. E, infelizmente, a 40 minutos de Santiago temos o segundo maior celeiro da Monsanto-Bayer da América Latina. Nossa luta é contra a Monsanto-Bayer e também contra empresas, por exemplo, com fazendas de porcos que contaminam todo o território e, nesse ponto, uma emblemática é a Agrosuper.

Já no centro-sul do Chile, há o problema da silvicultura, que é a monocultura de pinho que devastou territórios, expropriou terras e é aí onde se insere, sobretudo, o conflito Mapuche. Temos empresas florestais, a Mininco, que, embora chilenas, são empresas mistas, com capitais nacionais e estrangeiros, e vendas direcionadas à exportação. Tudo é exportação: mineração, agroindústria, indústria florestal. Temos um personagem, Luksic, por exemplo, que está tanto nas empresas de mineração quanto na agroindústria. Mas está, além disso, em outro elemento da repressão territorial: as usinas hidrelétricas. Em algum momento foram empresas grandes, como Endesa (espanhola), mas agora estão em moda as hidrelétricas de parque, que são menores, driblam a avaliação ambiental e estão, igualmente, degradando o território.

Assim, há uma empresa chamada RP Global, que em 2016 foi parte de um conflito em território Mapuche, onde, por fim, uma irmã Mapuche chamada Macarena Valdés foi assassinada. Ela resistia em seu território, na comunidade de Tranquil, sul do Chile, e amanheceu enforcada como se houvesse se matado, enquanto cuidava de seu filho menor e seu marido deixava o outro filho na escola. Mais tarde, fizeram perícia e se comprovou que ela havia sido assassinada e depois pendurada. Logo, tratamos de questões delicadas.

Outra agência do extrativismo feroz no extremo Sul é a salmonicultura, a produção de salmões. Isso também degradou territórios, gerou fontes de contaminação em um lugar muito importante na chamada Ilha Chiloé. Dessa forma, estou tratando de fazer caracterizações territoriais. Há uma mistura, no Norte também há agronegócio e etc. Aponto apenas o mais emblemático nesse percurso.

Pacs: E qual a relação das empresas com o Estado chileno?

Francisca: Algo muito importante a ser sublinhado: no Chile, o reconhecimento constitucional determina que o Estado é subsidiário. O que isso significa? Subsidia empresas privadas para explorar os bens comuns e exportá-los para obter seus próprios lucros, ou seja, um salário. O Estado subsidia essas empresas extrativistas através de decretos, leis e acordos. Por exemplo, temos um decreto-lei 701, por meio do qual o Estado subsidia empresas florestais para incentivar o plantio de monoculturas. Mas, além disso, volto a insistir, trata-se do monocultivo de madeira para exportação, para geração de lucros para essa empresa. Isto é, aqui estamos no extrativismo puro em sua máxima razão de ser, como agente do capital. Portanto, é um Estado subsidiário, um Estado que não assume a proteção da água e de outros bens comuns como um direito humano. Isso é muito importante salientar. Assim, delega tudo, subcontrata tudo e ainda investe nos lucros das empresas privadas. Tudo se relaciona com a Constituição de 1980. Por isso, hoje no Chile estamos nos dando tanto à luta por uma nova constituição via Assembleia Constituinte, porque, na realidade, a Constituição de 1980 é o que nos amarra ao neoliberalismo em todas suas esferas, que possibilita a privatização da água, da saúde, da educação; possibilita a privatização de tudo.

Pacs: E há impactos principais sobre a dinâmica da vida, das comunidades, com o meio ambiente?

Francisca: Sim, absolutamente. Por exemplo, um dos grandes impactos é a migração forçada. Por uma parte a privatização já havia gerado uma migração forçada do campo à cidade, dada à falta de acesso à terra e à água. No Chile, o Código de Água te permite uma coisa monstruosa: a água e a terra estão separadas. Sendo assim, você pode ser dono da terra, mas não dos direitos de água, os quais podem ser comprados por uma empresa. Logo, você vive na sua terra, mas a água pertence a uma empresa. Então há uma migração por conta da pressão, no próprio território, das empresas florestais, da agroindústria e da mineração e, de outra parte, há uma migração forçada oriunda do fato de que, embora você possa ter terra, não tem água, pois outro sujeito a tem monopolizada pelos direitos de água.

E, por outro lado, também aparece uma migração que chamamos “migração extrativista”, que são todos efeitos do despojo e contaminação dos territórios, o que faz com que as comunidades tenham que sair, porque a vida é insustentável; porque é insustentável respirar nesses lugares. Chamamos isso de “zonas de sacrifício”, ontem as chamamos “territórios em sacrifício”, onde há presença, por exemplo, de termelétricas, que matam todo tipo de vida, tudo.  Portanto, essa migração forçada, essa migração extrativista, também está gerando maiores cadeias de pobreza no contexto urbano. Porque, para onde estão migrando? Vão migrando, no contexto urbano, para onde não há política sanitária, onde há superlotação. E atenção! No Chile existem mais de 30 comunas[2] sem água potável. Há mais de 150 com escassez hídrica. Assim, falamos aqui de um problema de saúde pública, para além de uma problemática socioambiental.

Falamos disso agora na pandemia. Uma das principais campanhas da pandemia é para lavar as mãos. Aqui, no Chile, há comunidades inteiras que nem sequer podem fazê-lo, pois não têm água. Nós estamos trabalhando com uma categoria – com que outras feministas já trabalharam, mas estamos recuperando – chamada “soberania sanitária dos povos”. Assim como existe a soberania alimentar, através da agroecologia, das hortas familiares, também buscamos a soberania sanitária, do cuidado, da saúde comunitária. Essa soberania, portanto, é também super importante, porque, no fundo, é ela que, hoje, está permitindo a assistência de comunidades e não o Estado.

Pacs: Como as mulheres estão em meio a esses conflitos, em termos de impactos e resistências? Como você enxerga o patriarcado nesse contexto? E como elas são impactadas, como resistem?

Francisca: São essas contradições: mulheres e meninas – também acontece muito com as meninas – somos as mais expostas ao estrago do neoliberalismo, por conta do que expliquei, mas ao mesmo tempo isso possibilitou que fôssemos as mais mobilizadas. No entanto, ao sermos as mais mobilizadas, também somos as mais criminalizadas. Tem havido um movimento de criminalização, por exemplo, de autoridades espirituais Mapuche que são mulheres, as Machis. Temos muitos casos de Machis presas, justamente por causa da diferença de seus corpos de água, seus rios, como o próprio território Mapuche. Nessa área, então, existe essa contradição, há uma sorte de despertar de consciência, de despertar da luta pelos próprios direitos da natureza, em que água não é nem sequer um direito humano, mas um elemento vital para a manutenção e equilíbrio do ecossistema e, no fundo, a manutenção da própria vida de todos os seres que habitam o planeta. Ao mesmo tempo, esse despertar de consciência gerou uma existência bastante problemática, porque, precisamente: existe uma feminização do extrativismo, mas simultaneamente há uma feminização da luta, o que nos torna mais expostas, por exemplo, à criminalização, mas também a cyberbulling.

Temos um caso, recente, de uma companheira do MAT que estava sendo sistematicamente agredida por whatsapp. Tínhamos um grupo coletivo de informação socioambiental, no qual uns sujeitos entraram e começaram a enviar fotos de pornografia, de arma… E agora, como estamos em quarentena, não nos permitem fazer a denúncia porque essa tem de ser presencialmente. Bizarro! Estamos realizando uma rede de campanha para visibilizar que as defensoras, em quarentena, estão igualmente expostas ao assédio, ao abuso, à intimidação. Dessa forma, o lugar das mulheres é complexo, pois é um lugar em que temos, primeiro, de assumir essa condição de opressão, assumir que o extrativismo nos afeta, e que intensifica-se ao máximo em nós; e assumir que, sendo um lugar de resistência, é onde devemos gerar políticas de cuidado às mulheres e às dissidências sexuais e de gênero.

[1] https://www.brasildefato.com.br/2020/06/22/pl-que-permite-privatizacao-dos-servicos-de-saneamento-pode-ser-votado-nesta-quarta

[2] Uma comuna trata-se da menor divisão administrativa espacial do Chile. Equivaleria aos municípios brasileiros.

La Vida Antes que la Deuda: Entrevista a Beverly Keene

Beverly Kenne (Argentina) integrante de Diálogo 2000 Argentina JS/A, nos comparte sus perspectivas y experiencias en relación a las históricas luchas y acciones contra el impacto de la Deuda, profundiza sobre el actual contexto, la crisis socio-sanitaria y alimentaria agravada por el COVID-19, así como las acciones por la Suspención y Anulación del pago de la Deuda.

La pandemia del COVID-19 empeora las deudas sociales y evidencia la falta de protección estatal para la población pobre

La afirmación es de la abogada Magnólia Said, miembro de la Red Jubileo Sur Brasil. En una entrevista, defiende que el gobierno garantiza los ingresos a las familias y evalúa que las acciones de solidaridad permitirán la reanudación de los procesos de organización con la población.

A pandemia de COVID 19 agrava as dívidas sociais e evidencia a falta de proteção do Estado à população pobre, afirma Magnólia Said, membro da Rede Jubileu Sul Brasil. Ela ainda avalia que as ações de solidariedade permitirão retomar os processos organizativos da população.

Abogada agrónoma y feminista, Magnólia Said es miembro de la Red Jubileo Sur Brasil. Con especialización en salud, trabajo y medio ambiente para el desarrollo y en economía ecológica de la Universidad Federal de Ceará, en esta entrevista trata el tema de las deudas sociales en medio de la pandemia del nuevo coronavirus (COVID-19), así como las acciones para enfrentar esta realidad.

Explique cuáles son las deudas sociales y cómo están constituidas.

Las deudas sociales son las que resultan de las políticas sociales que no han sido aplicadas por los gobiernos en sus más diversos ámbitos. Por ejemplo, una política de salud selectiva que no satisface las necesidades de la población; una política de vivienda prácticamente inexistente y que, cuando se aplica, se traduce en viviendas inhumanas para las familias pobres de las ciudades; políticas educativas que no educan para la libertad, por el contrario, las encarcelan.

Ante la pandemia del COVID-19 que se extiende por todo el mundo, ¿usted percibe que estas deudas se agravan? ¿Dónde es más visible?

Con el coronavirus, estas ausencias se hacen mucho más evidentes porque las personas desprotegidas por la acción del Estado son objetivos fáciles para el virus. Estas son las personas que están principalmente en las periferias de las ciudades, en las zonas quilombolas, en las zonas indígenas.

Por otro lado, la pandemia hace más visible la fragilidad del sistema de salud y la incapacidad institucional del gobierno federal para hacer frente a tal situación. También hace visible el desprecio de las autoridades públicas por la vida de los pobres.

¿Qué acciones son necesarias para enfrentar esta realidad? ¿Cómo puede el pueblo actuar para enfrentar esta situación?

Inicialmente, el gobierno debe asumirse como deudor, no sólo de una deuda social, sino también de una deuda económica y ambiental que incluso puede ser pagada de varias maneras.

Para hacer frente a esta realidad en principio, para pagar estas deudas, el gobierno debe determinar un ingreso para miles de trabajadores y trabajadores sin contrato firmado. Pero no un ingreso mínimo, sino un ingreso que cumpla las necesidades principales de una familia.

Otra forma de pagar esta deuda es que el gobierno determine una inversión presupuestaria en el Sistema Único de Salud, el SUS, para que pueda atender con calidad y también, desde los puestos de salud, las Unidades de Atención Integral (UPAs), atiendan con calidad a quien necesite el SUS.

Otra forma de pagar esta deuda es que el gobierno haga una campaña de orientación masiva en TV, radio y otros medios. Al mismo tiempo, con personal calificado para informar a la población sobre la necesidad de permanecer en casa y la necesidad de distribuir mascarillas a las personas y familias que las necesiten.

¿Y cómo podemos enfrentar esta situación? Creo que en las acciones de solidaridad podremos retomar en las comunidades, en las periferias, en los pueblos, los procesos organizativos que se dejaron de lado hace mucho tiempo. Es el momento de que la gente vuelva a organizarse, para reflexionar sobre por qué viven de la manera en que lo hacen y el segundo momento, post-pandémico, es la gente organizada en las calles exigiendo derechos. Sólo conozco este camino y la historia nos ha mostrado que es el camino correcto.

Traducción por Jubileo Sur Américas

Fuente: Jubileu Sul Brasil

El golpe en Bolivia y sus reflejos en América Latina | Entrevista con Sandra Quintella

Publicado el 02/12/2019

Por Instituto Pacs

La salida de Evo Morales de su cargo el 10 de noviembre como resultado de una orden de arresto considerada ilegal por la policía y las fuerzas armadas bolivianas tras las protestas y acusaciones de fraude electoral, fue un golpe cívico y político contra la democracia. Junto a él, que había estado en el poder desde 2006, también renunciaron el vicepresidente Álvaro García, la presidenta del Senado Adriana Salvatierra, el vicepresidente del Senado Rubén Medinacelli y el presidente de la Cámara de Representantes Víctor Borda.

Bandeira Wiphala, símbolo do Estado Plurinacional Boliviano, que faz referência à organização da sociedade

dos povos originários andinos | Foto: Reprodução

Sandra Quintela, economista, educadora popular, miembro de la Coordinación de la Red Jubileo Sur Américas en Latinoamerica y el Caribe y vicepresidenta del Instituto Pacs, explica el contexto del golpe en Bolivia y cómo puede afectar a Brasil, así como las similitudes de los actuales escenarios políticos en los países latinoamericanos.

¿Cómo ve la realidad de América Latina hoy?

Lo que sucede en algunos países de Latinoamérica se refleja en toda la región. Así que estamos viviendo en 2019, 30 años de las más duras políticas neoliberales, desde el llamado Consenso de Washington concomitante con la caída del Muro de Berlín. Se trata de políticas que priorizan los intereses privados más que los públicos, asignando recursos del presupuesto público al capital privado y alejando de lo social, a través de los llamados ajustes fiscales. En la década del 2000, la América Latina detuvo estas políticas neoliberales a través de un ciclo político que eligió gobiernos progresistas como Evo Morales en Bolivia, Hugo Chávez en Venezuela, Cristina Kirchner en Argentina y Lula en Brasil. Significaba políticas sociales que permitieron luchar contra las consecuencias de estas desigualdades en la primera década del siglo XXI. Sin embargo, en los últimos años, la gente ha sufrido un revés en Argentina, Paraguay, Chile, Ecuador, ahora Bolivia y Brasil. Estamos viviendo una década de violencia en América Latina y el Caribe.

¿Cuáles son las características contemporáneas de un golpe de estado en 2019? ¿Y cuáles son las diferencias y similitudes de los anteriores golpes militares civiles corporativos?

Hemos estado siguiendo otros golpes en Latinoamérica y el Caribe desde 2004, con el golpe en Haití; 2009 en Honduras; 2012 en Paraguay; 2016 aquí en Brasil; y ahora en Bolivia en 2019. Cada uno de estos golpes presenta un perfil, una característica. Este en Bolivia fue un golpe de estado de otro tipo, con la presencia de policías y neopentecostales, lo cual es una novedad en la región. Ya existe cierta inestabilidad política en Bolivia desde 2016, en febrero, cuando se celebró un referéndum para cuestionar si la población aceptaba o no una candidatura por cuarta vez para Evo Morales, lo que no es realmente un problema. Angela Merkel, por ejemplo, ha sido Primera Ministra en Alemania desde 2005. El referéndum se llevó a cabo y no le dio una victoria a Evo Morales y apeló al Tribunal Supremo Electoral, el cual reconoció que podía postularse nuevamente.

Se intentó desestabilizar el gobierno y con las elecciones, la diferencia entre él y el segundo lugar fue muy pequeña. El presidente Morales ya había acordado convocar la segunda vuelta y convocar nuevas elecciones, pero eso no era suficiente. Además, sabemos que la mayor reserva de gas de América Latina se encuentra en Bolivia. Por lo tanto, una serie de factores que están detrás del golpe son también los intereses por los recursos. También hay matices muy claros de racismo en las élites blancas bolivianas.

Todo esto caracteriza al golpe de Estado en Bolivia. Siempre detrás de estos golpes hay un interés económico o grupos que quieren hegemonizar el control territorial. En el caso de Honduras, el golpe fue para la introducción de la agroindustria a gran escala, las grandes plantas de energía, las centrales hidroeléctricas y, detrás, el asesinato de Berta Cáceres. Aquí en Brasil estaban los intereses sobre Petrobras, la industria petrolera y el presal, que en mi opinión son esenciales para entender los fundamentos del golpe de estado de 2016.

¿Qué hay de la relación y la proximidad entre el contexto conservador en Bolivia y Brasil?

Tenemos una América Latina en ebullición, con Haití, Panamá, Honduras, Ecuador, Chile en las calles…. Y ahora Bolivia ha sufrido este golpe muy violento. Este es un país que tiene una mayoría de mujeres en los ministerios, en el poder judicial, en el parlamento, como lideresas comunitarias, en los ayuntamientos…. El primer gobierno que reconoce el gobierno golpista es el brasileño, es decir, hay indicios muy fuertes de la cuestión ideológica de desestabilizar los gobiernos de centro-izquierda, entre otras cosas porque su proyecto político es acabar con la izquierda a cualquier precio. Los reflejos son: la situación empeora y justifica el endurecimiento de la represión y de los grandes aparatos policiales; un posible apoyo militar brasileño a Bolivia debido a la frontera; y un escenario de creciente legitimidad en esta realidad de impunidad que estamos viviendo hoy en Brasil. Hay indicios de que el gobierno brasileño está involucrado en el golpe de Estado en Bolivia, por lo que es toda una discusión geopolítica que está en juego. A los brasileños nos resulta difícil pensar en Latinoamérica como una parte orgánica y fundamental de lo que es nuestra política, historia, economía y sociedad en este contexto más amplio, ya que Brasil siempre se encuentra aislado por su tamaño, pero nuestras historias son muy similares.

¿Cómo podemos relacionar los procesos políticos del campo progresista a nivel regional con la libertad de Lula? ¿Ves alguna relación?

La salida de Lula toca el tablero de ajedrez de la política brasileña. Cada pieza que se mueve, mueve todo el juego y implica la estrategia de todo este juego. La salida de Lula cambia esta estrategia. Tenemos que pensar si esto conducirá a una polarización aún mayor o a una ofensiva aún mayor, para que también podamos organizarnos. Fue el mismo día en que Lula fue liberado de la prisión y Evo fue liberado de su cargo. No veo una relación directa en esto específicamente, veo una relación directa con la reunión del comando militar en Brasilia el 10 de noviembre, y la salida de Evo por la tarde. En relación a Lula, como apuesta el Bolsonaro por la desestabilización, la cuestión a reflexionar es hasta qué punto esta salida puede contribuir a este escenario de polarización.

 

Fuente: Jubileu Sul Brasil